Frank - O Caçador #5: "Frank vs. Stein"


Hotel Principal - Área Nobre; 19h14

Pela porta giratória dourada surgia um homem que de imediato chamara a atenção de boa parte das pessoas que estavam ali presentes, esbanjando um ar de pura confiança e segurança. Suas botas pisavam no tapete verde-escuro que se estendia até o balcão de atendimento.

- Em que posso ajuda-lo? - perguntou gentilmente uma mulher loira vestindo uma camisa branca com um lenço preto e uma saia de mesma cor por cima de uma calça também preta, sorrindo para o homem de sobretudo bege que entrara, cabelo meio grisalho curto e rosto quadrado.

Ele sorriu na mesma hora, meio tímido.

- Vai reservar um quarto? - perguntou ela, estudando-o. - Ou veio checar a segurança?

- É, eu bem que estava afim de procurar uma diversão barata. - disse Frank, as mãos na cintura, sorrindo de modo extrovertido. - Mas já que perguntou... - olhou ao redor -... vou sim.

A mulher dirigiu o olhar para o emblema do DPDC bordado no sobretudo. O fitou meio séria.

- Um agente do Departamento Policial procurando um quarto de hotel? O prédio não fica muito longe daqui. Que estranho. - ela esboçou um sorrido rápido e o desfez lentamente. - Você me parece ser natural da cidade. - ela se retraiu, enrubescida. - Desculpe... Não quis parecer...

- Não, de maneira nenhuma. - disse Frank, interrompendo-a, tocando-a no ombro. Ele virou, falando baixo. - Já fui cantado por muitas vadias bem mais ousadas.

- Como é? - perguntou ela, fazendo uma cara de como alguém que não ouviu direito, mas escutou o básico para se sentir desconfiada.

- Hã? Não, nada, eu vou reservar sim. - disse Frank, desconversando ao se voltar para ela rapidamente.

- Ah, ótimo... - disse ela, o sorriso meio nervoso.

- Só deixa eu descarregar minha bagagem. - disse ele, afastando-se um pouco e abrindo o sobretudo. A mulher recuou vários passos, lívida e desejando gritar em pânico. Nos bolsos internos do sobretudo haviam diversas armas de fogo de grosso calibre.

Em um ato veloz e bem calculado, Frank retirara uma submetralhadora preta e apertara o gatilho, disparando uma arrasadora chuva de balas contra qualquer pessoa que estivesse presente no seu campo de visão. A mulher teve seu corpo sacudido pelos disparos, caindo com vários buracos no corpo. O alarido se intensificou até chamar atenção do lado de fora. Dois policiais entraram, armados com revólveres apontados diretamente a Frank.

- Ponha a arma no chão, agora! - bradou um dos policiais, severo.

Contra-atacando, Frank largou-a, mas, ousadamente, retirou outra praticamente igual do bolso da metade esquerda do sobretudo e descarregou boa parte da munição contra os fardados que mal tiveram tempo para reagirem. Ambos caíram de frente, ensaguentados.

A porta do elevador abria-se com seu conhecido sinal sonoro. Frank virou a cabeça de um jeito um tanto robótico em direção ao elevador e se encaminhou até lá. Olhou para uma câmera de segurança no teto enquanto andava e atirou nela com um revólver uma só vez. Notou um dos policiais rastejar no chão, baleado no corpo todo, e comunicando-se com um rádio-transmissor pedindo reforços urgentemente.

Frank, inescrupulosamente, mirou o revólver contra a cabeça do homem e disparara. O policial batera a cabeça no chão com um buraco no meio da testa, não tendo concluído a mensagem.

Um dos presentes no elevador tentou tranquilizar as pessoas mais do que desesperadas ao testemunharem tamanha crueldade.

- Calma, calma, ninguém sai! - disse ele, barrando a passagem e dando constantes olhadelas nervosas para Frank. - Vai ficar tudo bem!

- Ah, claro que vai... - disse Frank, sorrindo debochado ao se aproximar.

- Aperta a merda desse botão! - gritou uma exasperada mulher atrás do protetor, confiando que o único modo de se salvarem seria subindo de volta.

- Nos deixe viver, por favor. - implorou o homem, o rosto aflito.

- Desculpe. - disse Frank, apontando a submetralhadora, desesperando ainda mais as pessoas que suplicavam com expressões de horror. No entanto, nenhuma alternativa parecia funcionar para fazer despertar alguma compaixão naquele implacável assassino travestido de detetive. - Já estou fazendo um favor a alguém bem mais digno. - disparou, com um sorriso fechado de satisfação, vendo cada um dos corpos se debaterem com a rajada de balas dispersada.

Uma câmera não percebida filmara toda a ação.

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CAPÍTULO 05: FRANK VS. STEIN

Após uma ducha refrescante, o detetive mais requisitado do Departamento Policial de Danverous City passara por entre a cozinha e a sala de estar, logo pegando seu sobretudo que estava pendurado num gancho cravado na parede. Sua casa não aparentava ser tudo aquilo que os boateiros mais impulsivos expressavam aos quatro ventos. Apenas uma residência simples de um só andar, com paredes pintadas de branco, cercado e gramado na frente e uma pequena rampa que direcionava à garagem localizada no lado direito.

Ao por a vestimenta sobre um dos ombros, preparando-se para mais uma jornada de trabalho e deixar o sol da manhã banhar seu rosto, o telefone tocara, assustando-o de imediato, fazendo-o, sem querer, derrubar a chave do carro no chão. Apressado em apanhar a chave, o detetive usou a mão direita para pegar o fone. As pôs no bolso rapidamente, atendendo a ligação no mesmo instante. "Isso não é uma hora para me ligarem.", pensou ele, intrigado.

- Alô? - sua voz possuía um tom impaciente.

- Frank! Liga a TV, depressa, é urgente! - disse Carrie, aos sussurros.

- Ué? - indagou o detetive, sem entender. - Onde você está, afinal?

- Isso importa? Anda, vai logo, liga. - pediu ela, claramente alarmada com o acontecido bombástico sendo veiculado nos noticiários daquele horário.

- Não estou gostando nada disso. Me diz primeiro onde você está escondida. - insistiu Frank, preocupando-se. - Para estar falando assim...

- Estou no trabalho. - revelou ela. - Enfurnada num cubículo do banheiro há meia hora... tentando processar o que todos os jornais andam falando e querendo acreditar na minha intuição. Liga a TV, Frank. Rápido.

Vendo-se sem a mínima saída, o detetive tivera de ceder ao emergente pedido da assistente ao pegar o controle remoto e ligar a TV de LCD de 40 polegadas posta em uma estante baixa de madeira marrom escuro.

Um sentimento ligeiramente indescritível avassalou seu âmago ao se deparar com aquelas imagens aterradoras. Emudecido e boquiaberto, Frank esboçava um semblante estupefato, praticamente beirando a lividez total. Um nó na garganta o impediu de opinar sobre aquilo por vários segundos.

- Eu não estou... Eu não estou nada bem. Acho que vou hiperventilar. - disse ele, sentindo uma dificuldade respiratória repentina. - Que... Que... Que porcaria é essa? - se perguntou, franzindo o cenho. - Só pode ser brincadeira...

- Quisera eu que fosse. - disse Carrie, exasperada ao telefone. - Mas não. É bem real. Estampado para todo mundo ver.

- Eu... - disse, apontando para a tela com o indicador esquerdo, agora demonstrando uma certa raiva - Eu não fiz isso! Esse não sou eu! Carrie, me diz, por favor, que você não acredita nessa droga...

As imagens do telejornal destacavam filmagens de circuito interno de câmeras em uma agência bancária bastante frequentada e localizada na área nobre da cidade. Nelas, via-se Frank, armado com uma metralhadora M60, abrindo fogo a esmo contra várias pessoas que ali se encontravam, em um alarido barulhento e dramático.

A repórter relatava os fatos enquanto as imagens seguiam-se repetitivas:

- Qualquer tentativa de para-lo ou prende-lo se mostrou em vão durante um contra-ataque da Força Tática Policial. Para os sobreviventes desse horrendo massacre o criminoso é desconhecido. Mas, em contrapartida, estuda-se a possibilidade de uma maior avaliação e, além disso, uma obtenção da identidade desse atirador através de possíveis conhecidos que tenham, em alguma ocasião, cruzado seu caminho.

Frank pusera sua mão na cabeça, desesperando-se.

- Agora essa... - disse ele, frustrado ao ver a si mesmo disparar uma saraivada de balas em inocentes. - É a Força Tática. Encrencado é pouco pra minha situação.

- Pois é, não vão demorar para chegarem até você, armados até os dentes e proferindo voz de prisão. - disse Carrie, a fala rápida e sussurrante. - Mas é a área nobre, não me recordo de muitos casos paranormais investigados por lá.

- Lembro de uns 3 ou 4. - disse Frank, tentando se recordar. - Olha, faz o seguinte: Quando sair do banheiro aja naturalmente, como se... como se você fosse a última a saber.

- O quê? Sem chance. - recusou ela. - Odeio ser a última a saber. Odeio ainda mais fingir.

- Esse é o menor dos problemas, comparado à desculpa que você vai ter que dar por ter ficado mais de meia hora no banheiro. - retrucou Frank, mantendo-se aflito. - O que não é nada comparado a esse problemão dos infernos aí.

- Não esquenta, eu me viro. - garantiu ela. - Por agora, vamos nos concentrar em manter você seguro.

- Como? Já vejo a hora dos caras de colete apontando armas para minha casa e chutando a porta da frente. - disse Frank, andando de um lado para o outro, sem ter como manter a calma.

- Fala como se fossem chegar em uns 10 minutos. - disse Carrie, procurando acalma-lo. - Você viu a notícia? Ainda estão nas preliminares. É uma questão de "se" não de "quando". Eu vou te ajudar. Só preciso de um plano.

- Você sempre tem. - disse o detetive, adquirindo confiança. - E nada melhor do que começar com uma bela pesquisa. - fez uma pausa, fechando os olhos por um tempo. - Sabe... Você não ter perguntando sobre onde eu estava na noite de ontem, se eu saí pra algum outro lugar... É aliviante. Mostra que confia em mim.

- Honestamente... - disse Carrie, exalando uma seriedade um tanto atípica de sua parte. - Foi a primeira coisa que pensei em perguntar assim que vi a notícia. Não me interprete mal, por favor. Conheço você o suficiente... para perceber como realmente age, pensa e fala. Você é um assassino de monstros... não de pessoas. Esse cara não é você. Tem a sua aparência, as roupas, o jeito... Até que foi uma imitação convincente.

- Como é que é?! - questionou Frank, fazendo uma expressão confusa. - Bom saber que aprecia essa arte.

- Estou brincando, idiota. - disse Carrie, dando uma leve risada no outro lado da linha. - O que estou fazendo? Eu sou louca, não é? Rindo enquanto meu melhor amigo está em maus lençóis.

- Não precisa se arriscar por mim, Carrie. - pediu Frank, enfaticamente. - Não dessa forma. Só faz a pesquisa e me manda uma única mensagem pelo celular. Quero pegar esse impostor desgraçado, nem que seja a última coisa que eu faça. - declarou, denotando raiva em seu tom.

- Está bem. - aquiesceu Carrie, suspirando. - O que quer saber? Qual sua teoria?

- Presumo que já ouviu falar de doppelgângers, certo?

- Sempre quis ter uma irmã gêmea. - disse Carrie, parecendo sair do assunto.

- Foco. - exigiu Frank, sério. - Acho melhor eu verificar nos arquivos do meu pai. Deve haver algo relacionado. Alguma criatura que assuma a forma de uma pessoa por qualquer tipo de contato.

- Boa ideia. - concordou a assistente, falando mais baixo. - Parece lógico.

- E vou repetir: Aja naturalmente. - recomendou o caçador, falando do modo mais enfático possível. - Vou trancar as portas e janelas. Todas. - disse, fechando as persianas de uma das janelas. - Na verdade, nem deveríamos estar conversando por telefone.

- Por que não? - indagou Carrie.

- Os caras da Força Tática - especulou Frank - possuem meios de acesso e rastreamento que fazem todos os outros sistemas conhecidos parecerem brinquedinhos de criança. O DPDC está localizado à cerca de 20 quilômetros da área nobre. Não me deixaria surpreso se suspeitassem de alguém do departamento, por causa das roupas do impostor.

- Por sorte, o diretor está do nosso lado. Vou fingir ter chegado há poucos minutos e falar com ele em particular. A menos que um certo alguém interrompa. - disse Carrie, referindo-se à nova secretária, Megan.

- De quem está falando? - perguntou Frank, desligando a TV com o controle.

- Ninguém em especial.  desconversou ela. - Vou seguir seu conselho. Nos falamos depois. Tome cuidado e não saia de casa.

- Ei, espera aí: O que quer dizer com nos falarmos depois? - perguntou o detetive, suspeitando que a assistente pudesse estar tramando algo para apoia-lo da maneira mais perigosa e imaginável.

- Não ficaremos incomunicáveis. - retrucou ela. - Eu disse que ia ajuda-lo e o farei. Mesmo que precise custar minha carreira. - e desligara abruptamente.

- Mas o que... - disse Frank, cortando a frase ao ouvir o barulho que significava Carrie ter encerrado a ligação. Pôs o fone de volta ao gancho, tentando não imaginar qual seriam os passos que a assistente resolveria seguir para participar desse caso em função de ajudar o detetive a livrar-se da acusação.

Enquanto descia as escadas do porão, segurando uma lanterna, Frank lembrara-se da última frase dita por Carrie, a qual gelara sua espinha. "Carrie está determinada a fazer o que for preciso para me salvar. Mesmo que isso a atinja profissionalmente. Ela não estava brincando. E pode sofrer sérias consequências por minha causa.", pensou ele, direcionando-se ao grande armário de gavetas onde encontrava-se o compilado de anotações escritas pelo finado caçador da linhagem Montgrow. "Quem quer que seja... Com certeza está afim de me prejudicar.".

- Vamos lá... Gaveta A-005... - dizia ele, passando o facho de luz da lanterna pelos números nas gavetas colocados em adesivos brancos. Ao encontra-la, na segunda fileira, enfiara a mão direita em um dos bolsos da calças, retirando em seguida uma pequena chave para destrancar a gaveta. Inseriu a chave na minúscula fechadura no canto direito da gaveta e girou-a.

Ao abrir a gaveta, Frank deixara a lanterna posicionada em uma mesa velha atrás de si e extremamente empoeirada, e passava os dedos para procurar qual pasta abordava a lenda dos doppelgângers.

- Lobisomens... Sereias... Wendigos... Tulpas... Duplicatas... onde estão?

Um item de uma pasta chamou sua atenção pelo nome.

- Stein? - indagou ele, levantando uma sobrancelha. - O que é isso? - perguntou-se, puxando a pasta amarela.

Entretanto, ao abrir-la para visualizar seu conteúdo, a mesma encontrava-se vazia, para a infelicidade do detetive.

- Mas que... Merda. - reclamou, franzindo o cenho. - Não tem nada. - passara a achar curioso e suspeito tal abordagem estar ausente naquele vasto catálogo de seres sobrenaturais.

Ficou a imaginar as razões que levariam ao sumiço do arquivo, se vendo sem outras opções.

                                                                                       ***

Em algum lugar não muito distante dali, uma moça de aspecto jovial vestindo uma blusa branca com mangas que iam até os pulsos depositara seu livro sobre uma empoeirada mesa de madeira, levantando uma efêmera nuvem de poeira em meio à luz meio branca-amarelada da única lâmpada do escuro cômodo.

A mulher possuía cabelos loiros cacheados que caíam aos ombros. Esboçou um sorriso pretensioso ao encarar o livro com seus olhos azuis, as mãos apoiadas na mesa.

- Hora de mais uma missão.

                                                                                       ***

Departamento Policial da Danverous City 

O diretor irrompeu furioso pela porta da sala de Carrie bufando de decepção após ser inteirado dos últimos acontecimentos envolvendo seu melhor agente.

- Onde está aquele safado, Wood? - perguntou ele, surpreendendo-se ao não vê-la presente. - Ué, cadê...

A assistente chegara, mas parou na soleira tomando um contido susto ao se deparar com a postura do diretor que reconhecia em um só vislumbre. "Ai, caramba... Não tenho dúvidas, está uma arara!".

- Ah, aí está você! - disse Ernest, virando-se à ela com a expressão raivosa. - Será que dá pra me explicar que tipo de surto seu amiguinho super-confiável teve a ponto de sair daqui e ir até um lugar aleatório encher pessoas inocentes de balas?

Carrie fechou a porta com pressa, receosa quanto ao tom de voz do chefe acabar chamando atenção em quem passasse por ali. Suspirou, tentando fazê-lo se acalmar.

- Olha... Garanto ao senhor, eu fui a última pessoa com quem ele falou ontem à noite, e o ouvi dizer, com todas as letras, que iria para casa, teve um dia trabalhoso, sabe, enfrentou aqueles...

- Não quero saber! - bradou o diretor, andando pela sala a passos largos. Olhou para Carrie com "sangue nos olhos" - A propósito, onde a senhorita estava esse tempo todo? - perguntou, altamente ríspido.

- Pra ser sincera... - disse Carrie, sem baixar a cabeça - ... no banheiro. Acho que sei o que está pensando.

- Ah é? O que seria? - indagou Ernest, levantando uma sobrancelha. - Vamos lá, adivinhe.

- Que estive falando com ele às escondidas agora há pouco. E pela sua expressão, creio que acertei. - declarou Carrie, com um sorriso de canto sem medo algum da explosão do chefe.

- Não me diga que está tentando acoberta-lo com alguma criatura sobrenatural que ele sugeriu que estivesse por trás disso! Uma criatura que assume a aparência de qualquer um! Estou enganado?

- Foi nossa primeira suspeita. - disse Carrie, logo dando passos até o diretor querendo convence-lo esforçadamente - Tenta seguir meu raciocínio, por favor. O conhece há anos, deu à ele esse emprego porque acreditava que ele tinha um potencial único e íntegro e agora, de repente, você quer a cabeça dele na sua mesa por ter visto uma simples filmagem onde o viu fazendo algo que ele jamais faria nem se estivesse louco. O Frank não tem que enfrentar essa sozinho.

O diretor ainda mostrava-se irredutível, mas no fundo encontrava-se confuso.

- Não devia estar contactando ele por celular, a força de elite mais disciplinada da cidade pode rastrear sua ligação, se é que já não pode ter feito.

- É, eu sei, ele me disse a mesma coisa. Escuta, o senhor precisa me ajudar. - pediu Carrie, os olhos quase suplicantes - O Frank que o senhor viu na TV metralhando aquelas pessoas... não, ele é não esse homem. Ele, o verdadeiro, pode estar tentando encontrar algo que satisfaça as especulações sobre se é ou não uma criatura, algum tipo de doppelgânger ou metamorfo... Alguém está usando a aparência do Frank para ferrar com a vida dele. Vamos nos basear nessa premissa.

- Eu não sei... - disse Ernest, incerto e preocupado, passando a mão no rosto - Faz ideia das implicações terríveis dessa confusão para o departamento? Em como isso vai afetar a todos, inclusive você? Se esse suposto impostor...

- É um impostor! - disse Carrie, o tom enfático e a expressão séria e desafiadora.

- Está bem. - disse Ernest, mais calmo - Se esse impostor continuar assassinando deliberadamente pessoas como se a vida humana não tivesse nenhum valor, a imprensa, o governo e o Conselho da Segurança vão mirar suas garras no departamento e todos correm o risco de perderem seus empregos, isso aqui pode fechar as portas para todo o sempre. Se continuar nesse ritmo nas próximas 48 horas e nada que prove a inocência de Frank vier à tona... - fitou a assistente com um certo temor que queria partilhar - ... receio que a partir daí será o fim do DPDC.

Carrie engoliu a saliva, sendo tomada por uma preocupação latente que fez gelar suas mãos.

- Eu quero ver de novo. - pediu ela, com firmeza.

- O quê? - indagou Ernest, sentindo-se perdido naquela torrente de estresse.

- Quero analisar a filmagem, detalhe por detalhe, frame por frame. Essa história não pode acabar com Frank atrás das grades, o DPDC fechado e depois o Frank ser transferido para uma penitenciária de segurança máxima onde vai sofrer bullying dos piores criminosos do país. - fez uma pausa, olhando fixamente para Duvemport - Onde é que está?

O suspiro longo do diretor denotava hesitação. Retirou do bolso do terno um pendrive cinza no qual continha uma cópia do vídeo televisionado em rede nacional.

- Obrigada. - disse Carrie, recebendo-o e em seguida até seu notebook. Conectou o dispositivo e aguardou alguns segundos no carregamento do arquivo. A presença prolongada de Ernest pareceu incomoda-la. - Vai ficar aí para assistir? Eu vou demorar pelo menos uma hora e meia.

- Vou deixa-la em paz. Sinto que o Conselho vai puxar minhas orelhas daqui a pouco - disse o diretor, sacando o celular ao ouvir o vibrar que sinalizava nova mensagem - É bom se apressar.

- O quê? O que foi? - perguntou Carrie, olhando de relance para ele.

- A Força Tática está se mobilizando para a fronteira. - informou ele, a voz meio tensa. - Uma divisão dela, aliás. Um plano de contingência para impedir Frank de sair da cidade. A outra parte está se movendo para um banco... invadido agora há pouco pelo falso Frank. De acordo com minha fonte, mais de quinze pessoas foram gravemente alvejadas. É uma chance para pega-lo.

- Por via das dúvidas, prefiro tirar minhas próprias conclusões. - disse Carrie, pronta para realizar uma análise minuciosa.

- Acha que a FT não vai ser capaz de segura-lo? - perguntou Ernest, intrigado.

- Essa coisa deve ser muito esperta. Ou se acha, mas consegue ser, como no hotel ontem. Nada garante que os caras da elite vão sair ganhando, ele é aparentemente invulnerável à balas segundo o que eu vi. Os vigilantes não o enfrentaram por muito tempo, mas desse pouco se pode extrair uma grande pista. - apertou o play do vídeo - Muito bem, vamos caçar uma nova.

                                                                                          ***

Voltando do porão a passos desesperados, Frank escutava um pequeno alarido do lado de fora. Passou pela cozinha e foi em direção à sala de estar com o cenho franzido, curioso a respeito do bate-boca.

No gramado da residência do detetive, cerca de 5 pessoas, duas mulheres e três homens, estavam reunidas em polvorosa tendo em vista no quanto era impactante ter como vizinho o temível atirador que ganhava os holofotes nos noticiários em todos os canais. Uma aparente divergência estava dando seus indícios.

- Chamar a polícia é a ideia mais segura. - atestou uma das vizinhas, uma mulher caucasiana de cabelos castanhos aparentando ter em torno de 30 e poucos anos. Estava retrucando um insistente homem que ameaçava queimar a casa mesmo que Frank estivesse dentro - De que adiante fazer uma loucura dessas? Vai trazer aquelas pessoas de volta? Não! Então é melhor nos acalmarmos e alguém se habilitar a fazer o que é correto.

- Nós nem sabemos se ele está aí. - disse outro homem, um rapaz negro com vestes comuns (bermuda e camisa) que passeava seu com seu cachorro, um beagle, e foi atraído pela confusão. Morava na vizinhança da frente - Querem saber de uma coisa? Não vou ser cúmplice. Eu voto contra. - ergueu a mão esquerda.

- Ah, vai defender o desgraçado é? - perguntou o exasperado homem contrariado. De rosto fino, olhos meio fundos, era meio calvo, mas tinha uma barba moderadamente cheia. - Olha, entendam. Vai ser melhor pra todos. Vamos sair ganhando.

- Ganhando? - indagou outra mulher, esta sendo de cabelos pretos amarrados, cética - Que vantagem tem em incendiar a casa de um assassino? Dá pra ver que quer que a gente saia disso com um falso espírito de justiça. Vai ter que se esforçar mais, eu não sou idiota.

- Só esclarecendo: Voto contra a invasão ou queimar tudo. Quero esse cara na cadeia tanto quanto vocês, porque é... é desumano, aquelas pessoas tiveram suas vidas tratadas como lixo. Mas acho que fazer justiça com as próprias as mãos não vai resolver.

- Eu também voto contra. - disse a mulher de cabelos pretos, a que mais parecia estar enojada com a postura de líder radical do homem revoltado.

- Eu também. - disse a mulher de longas madeixas castanhas,  com um olhar desafiador. - Incendiar e depois fazer parecer acidental... Não, eu valorizo meus princípios e eles me dizem para chamar a polícia e deixar que a lei resolva e não o seu plano que é bem precipitado, diga-se de passagem.

- Ótimo, todos contra mim. - disse o homem, dando de ombros, satisfazendo-se com as reações contrárias á sua ideia. Virou o rosto em direção a fachada, revelando ser um demônio através de seus olhos inteiramente pretos. Depois virou-se para os vizinhos, voltando "ao normal" - De qualquer forma, não preciso de vocês pra isso. Cansei de forçar cooperação. - falou, em tom rude, intencionando ir ele mesmo invadir.

A mulher que julgara o plano como precipitado sacou seu celular, discando o número.

- Bem, mais uma razão pra ligar. - disse ela, corajosa.

- Me dá isso aqui... - disse o homem, avançando suas mãos contra o celular para tira-lo da mulher que o segurava firmemente. Com os ânimos exaltados, os outros dois tentavam apartar a briga. O cão latira, contagiado pelo forte atrito.

Observando por uma ínfima brecha que formava com os dedos na persiana, Frank sentiu um frio na barriga como nunca antes tivera.

- Puta que... - disse, interrompendo-se e fechando os dentes em raiva - Não bastasse ter que ver um falso eu matando gente, agora descubro que um dos meus vizinhos é um demônio. O que será que falta pra deixar isso tudo mais problemático pro meu lado?

                                                                                        ***

Carrie tinha perdido as contas quantas vezes tinha visto a mesma filmagem em busca de uma prova que corroborasse a suspeita de algo sobrenatural.

Deixou rodar em câmera lenta para facilitar convenientemente no ponto onde o FakeFrank mostra-se mais explícito no meio da imagem. Isto depois de metralhar os ocupantes do elevador.

A assistente tirou as costas da cadeira, aproximando seu rosto petrificado de curiosidade à tela. Quando FakeFrank vira-se após a chacina, guardando a sub-metralhadora, percebia-se uma fraca luminosidade verde provinda de seu peito.

- Mas... o que é isso? - indagou Carrie, estreitando os olhos, constatando que não notaria aquilo na velocidade normal. - Deve ter durado uns 3 milissegundos. - rebobinou na câmera lenta. Estava claro. Uma luz verde piscara do peito do assassino impiedoso. - Ele não está usando cordões, nem nada que possa refletir a luz... - pegou o celular para ligar para Frank imediatamente.

                                                                                       ***

O celular de Frank tocou, assustando a ponto de fazê-lo estremecer com o corpo todo. Quase não atendia devido à tremedeira rápida gerada pelo abrupto toque. A confusão do lado de fora tinha cessado com a mulher fugido das mãos do líder radical do grupo. A discussão ocorria entre três agora, com tons de voz bem elevados.

- Merda, logo agora... - disse ele, baixinho, afastando-se da janela. Atendera, quase sem respirar - Carrie, não vai acreditar...

- Espera, eu primeiro. - disse ela, cortando ansiosa - O diretor me deu acesso exclusivo a uma filmagem na íntegra do circuito interno do hotel.

- Me diga que fez ele desistir de empalhar minha cabeça na sala dele.

- Calma, ele acreditou em mim. Descobri algo que deixa uma ponta de dúvida, mas não o bastante para uma pesquisa. O cara tem uma kryptonita brilhante no peito. Se é que podemos chama-lo de cara...

- Co-como é o negócio, Carrie? - perguntou Frank, franzindo o cenho, ao mesmo tempo em que lutava contra a vontade de destrancar a porta, sair e acabar com aquela briga de vizinhos - Kryptonita? É alguma referência ou alguém te ofereceu uma droga com esse nome?

- Você nunca leu os quadrinhos?! - soltou ela, espantada pelo companheiro não fazer ideia - O Superman enfrentava um vilão que usava um coração de kryptonita, eu esqueci o nome dele, mas não importa, temos uma pista finalmente. E não tô chapada, acabei de assistir com plena lucidez.

- Foi mal não ter entendido, após a morte do meu pai eu passei a ler histórias bem diferentes... você sabe. - disse Frank, cada vez mais nervoso.

- É, eu sei sim. - aquiesceu Carrie, compreendendo - E não foi só isso. Notei, digamos, traços... meio mecânicos... Nem um pouco humano.

Frank conteve uma risada que só não era maior do que a vontade de chorar.

- Espera... Tá insinuando que esse falsário... é um robô?! Um robô, Carrie?

- Vou dar um jeito de copiar o arquivo e transferi-lo pro cartão de memória do meu celular pra enviar pro seu. Só leva uns cinco minutos. Aliás, acho que posso ir tentando uma pesquisa.

- Então é melhor ir rápido nesses cinco minutos. - disse Frank, preocupando-se com o nível que a briga atingia lá fora - Que não dure mais de 10 episódios.

- O quê? - indagou a assistente, fazendo cara de não ter entendido nada.

- É de um desenho japonês. - disse Frank, sem dar muita importância. - Você tem um sobrinho de 8 anos que adora, achei que ele assistia com você.

- Não ligo pra TV. - disparou ela, sucinta. - E não me sinto culpada por não ter entendido a referência. - fez uma pausa, estranhando - Está falando meio tenso... O que tá rolando por aí?

- Minha vez de contar, finalmente. - disse Frank, indo até a cozinha - Vizinhos irados querendo minha cabeça. Um deles cogitou incendiar minha casa... Adivinha só: O que tem olhos pretos, é mestre na manipulação e propõe ideias exageradas no meio de pessoas sãs e que não querem suas fichas sujas?

- Ai caramba... - disse Carrie, imaginando - Um vizinho demônio?! Seu mar não está mesmo pra peixe hoje. Por que tão próximo de você e justo agora nesse momento tão delicado que você passa?

- Também gostaria de saber. - disse ele, abrindo a dispensa e pegando um recipiente cilíndrico de plástico onde se guardava sal grosso. - Em todo caso, vou lacrar as janelas e a porta com a proteção adequada pra esse tipo de praga. - fora andando de volta até a sala. - Ele não conseguiu convencer ninguém, está o maior barraco lá fora.

- Demônios são mestres da manipulação, como você disse, mas parece que está lidando com um amador que não teve sorte de principiante.

- Não quero saber se é profissional ou amador - disse Frank, jogando o sal nas janelas abaixo das persianas -, vou mante-lo a distância. Boa sorte com a pesquisa.

- E você com o capetinha. - disse ela, desligando. Frank também encerou a ligação, agachando-se para derramar sal embaixo da porta, formando uma linha reta. Aquela altura, o barulho cessou.

Os outros dois vizinhos resolveram tomar distância do "líder" violento, o qual andara em direção a residência com altivez exalante.

- Pronto. - disse Frank, recuando - Vou preparar um disfarce... e ir me esconder na casa de ferramentas da casa da Carrie, um dos poucos lugares realmente seguros. Por que não pensei nisso antes? Lá é o único ponto da cidade onde o rastreamento telefônico é difícil. - decidiu, correndo em direção ao seu quarto a fim de se preparar para a sorrateira fuga.

O demônio estacou poucos metros próximo à porta, novamente elucidando seus negros olhos que expressavam desconforto.

- Maldito seja. Sinto esse cheiro repugnante... vindo de todas as aberturas. - disse, fungando o nariz como se estivesse farejando - Que pena. Uma morte falsa seria a única saída dele pra se livrar da garota psicótica.

                                                                                        ***

Assumindo o risco de sair pela calada da noite na averiguação de um dos locais afetados pelas ações criminosas do impostor, Frank andava de modo tranquilo falando ao celular com Carrie em meio a um deserta rua. Do outro lado da linha, a assistente exigia explicações sobre o lance do disfarce e do esconderijo improvisado.

- Está tudo no seu devido lugar, Carrie. - disse o detetive, cuidadosamente esquadrinhando os arredores com os olhos - Não xeretei nada, não assustei seu gato e nem espiei pela janela. Olha, são quase uma da manhã... Talvez você deva me dizer o descobriu amanhã cedo. O que acha?

- Perdeu mesmo a noção do perigo. - disse Carrie, desapontada - Nem se atreva a desligar. Você me tranquilizou sobre o disfarce e o refúgio, mas podia ter tido a decência de me avisar sobre esse plano de última hora. Além do mais, pisar os pés no DPDC é selar seu destino cruel. Até você ser inocentado, vamos ficar em contato só por telefone.

- Você disse que era questão de "se" não de "quando" sobre a FT me rastrear. Isso também se aplica a como vou terminar nessa história. - declarou Frank, transparecendo desesperança na fala o que de imediato incomodou sua colega.

- Vai sair dessa sim... Eu prometo. - disse ela, a voz séria e determinada. - E antes que pergunte: Sim, sua inocência provada também depende do meu talento investigativo. O diretor vai ficar sendo sondado com minhas informações e será um jogador duplo.

- Sabe que desse jeito tá envolvendo o nosso chefe numa encrenca das brabas, certo?

- Sim, eu admito que se as coisas desandarem, e espero que não, a situação vai ficar preta e vamos ser apontados como cúmplices de um terrorista. Sabe, eu preciso de uma sessão de descarrego, toda essa atmosfera sombria de pessimismo tá me deixando deprimida... Mas vou te contar uns detalhes, só como aperitivo, já que está tão apressado pra voltar pra casa.

- Não estou indo pra casa. - respondeu Frank, aproximando-se do banco assaltado na manhã daquele dia. Olhou de esguelha à sua direita e percebeu dois fachos de luz vindo dos faróis de um carro cujo formato soou familiar. - Duplicatas podem estar ligadas a verdadeira pessoa. Ele pode ler minhas emoções e decifrar minhas decisões. Ou podemos seguir a outra lógica: O criminoso sempre volta ao local do crime. Talvez as duas estejam certas.

Carrie assumiu um tom apreensivo.

- Espera aí, se não está indo pra casa...

- É, Carrie, quase adivinhou. Vou pegar esse miserável por minha conta e risco e nem quero saber de sermão, vou com tudo pra cima dele e acho que não estou muito longe...

- Não, Frank, vai com calma! - disse ela, quase gritando. - Você ficou maluco?! Pirou de vez?! Espero que ainda esteja com disfarce, pelo menos.

- Que disfarce? - Frank estranhou a velocidade do carro ter diminuído.

- Ah, não! Não pode enfrentar essa coisa desarmado! Nem sabemos direito o que é! A menos que eu convença você a correr daí depois de escutar o que tenho pra falar.

- Então diz logo, ele tá quase parando. - pediu Frank, endurecendo o tom. Seu olhar fixou-se de forma sisuda no carro.

- Já está aí?! - espantou-se ela - OK... Eu dei uma olhada na internet, o lance do brilho verde no peito dele... Ele pode ser um tipo de ser de metal conhecido como Stein.

- Stein!? - disse Frank, arregalando os olhos ao ouvir o nome da criatura que possuía arquivo vazio nas pastas do armário - O exterminador é um Stein!? É isso que eles são?

- Por que a surpresa?

- Não tinha nada sobre isso nos arquivos do meu pai. - revelou o detetive, recuando alguns passos ao ver a porta se abrir. - E sobre a coisa no peito dele?

- Aqui diz que eram protótipos do que se esperava ser... a espécie substituta. Mas que só podiam ser concebidos com vida através de uma pedra mágica chamada Orb Esmeralda. Uma civilização milenar conhecida como Anakons foi responsável por cria-los para gerar mais safra nos trabalhos agrários e essa prática atravessou gerações, do barro ao metal. Os Anakons, de início, viviam como nômades ou indígenas, até irem se adequando a sociedade moderna. Tem tempo pra dizer o resto?

- Bem, ele já saiu do carro... - disse Frank, estreitando os olhos e enfim percebendo, perplexo - O meu carro!? - voltou sua atenção à Carrie - Ahn.. Vai, diz aí, ele ficou parado.

- Então só se concentra na minha voz. - disse ela, depois pigarreando - Ainda que o Orb dê vida própria ao Stein, para que ele execute atividades humanas é necessário um painel de controle que na verdade é um livro. Ele é escrito na língua primitiva da tribo, a linhagem mais antiga tinha conhecimento sobre o poder do Orb e estabeleceram ligação com a pedra banhando-a com sangue. Estava formada a conexão. Só membros da tribo Anakon conseguiriam criar Steins e somente alguém da linhagem leria os hieróglifos do livro que nada mais são do que comandos, escritos com o sangue dos ancestrais.

- Agora tudo faz sentido. - disse Frank, a tensão tomando conta da voz. Pressionava com força o celular ao ouvido.

- Nem tudo. Falta saber porque um demônio se passou por um vizinho revoltado e justiceiro. - relembrou Carrie. - Tenho quase certeza de que isso não tem nada a ver com o caso.

- Eu também. - concordou Frank, ficando nervoso - Ele está andando...

- Você compreendeu tudo o que eu disse? - perguntou Carrie, querendo certificar-se. - A pessoa que está por trás disso é um descendente.

- Sim, Carrie, eu já entendi. - disse Frank, elevando o tom.

- Se quer desligar e tirar satisfações com ele, vai em frente, mas só tente sair inteiro. E cuidado com as câmeras, o sistema de vigilância daqui acatou uma ordem direta para rastrear cada ponto da cidade na intenção de pegar você. Estão te subestimando.

- Verdade. Me deseje sorte. Quero ver a cara desse desgraçado. - disse Frank, enchendo-se com bravura e ódio, encerrando a ligação.

O momento da verdade estava prestes a ser decretado.

Como dois cowboys em um "faroeste noturno", os dois se encararam - embora Frank não pudesse ver claramente o rosto por conta da pouca iluminação. O detetive fez um leve aquecimento ao mover os dedos para pegar dois revólveres no coldre do seu cinto.

- Até que enfim você veio, hein. - disse, sacando as armas e mirando-as - Nessa cidade só há lugar pra um Frank Montgrow. - falou, logo em seguida apertando os dois gatilhos disparando incessantemente enquanto dava passos adiante.

As balas claramente não surtiam efeito contra o resistente corpo do Stein que caminhava tranquilamente na direção do detetive. Apenas alguns furos na roupa e nada mais.

Frank estava a um passo de desistir de tentar.

- OK. - disse ele, parando de atirar. - Você é um Frakenstein de metal... Tô gastando munição à toa. - guardou as armas - Podemos resolver isso do jeito fácil. Está sendo controlado por uma pessoa má...Te mandando fazer coisas que eu nunca faria. Você e eu somos o mesmo. Podemos ser até irmãos... - disse, erguendo de leve sinalizando pacifismo - Mas não vou negar seu direito de escolha. Me matar aqui e agora... ou se libertar. - o Stein ter cessado a caminhada mostrou-se um sinal positivo. Deu um sorriso fraco - E aí? Segunda opção?

A cópia maligna berrara raivosamente em um grito que soou quase hipersônico aos ouvidos de Frank.

- Acho que isso quer dizer não. - disse ele, cutucando um ouvido com um dedo e afastando-se temerariamente. O Stein avançara selvagemente contra o detetive correndo, logo pegando-o pelo sobretudo e o jogando com violência contra um poste de placa de trânsito que fora derrubado para trás graças ao impacto com as costas de Frank e caíra completamente se rompendo do chão.

A dor logo acometeu Frank de forma aguda, enquanto ele entrevia a forma do seu oponente peso-pesado se aproximando com ameaça. Se esforçou para levantar, mas quando imaginou que ficaria de pé e pudesse ter a chance de fugir já era tarde demais. O Stein o agarrara pelo pescoço, apertando com bastante força, deixando os pés do detetive alguns centímetros longe do chão. O ar escapulia aos poucos dos pulmões de Frank sentindo o peso daqueles dedos metálicos revestidos de pele falsa bloquearem o fluxo sanguíneo das artérias carótidas.

- Só existe um Frank. Eu. - dissera o impostor, o tom ranheta e severo. O detetive surpreendeu-se com a voz idêntica à sua - Você perdeu, idiota. - antes que fizesse algo para liquidar Frank de uma vez por todas, como quebrar o pescoço, certas luzes vermelhas e azuis interromperam e chamaram sua atenção. Sons de sirenes policiais se avizinhavam com alarde, provavelmente alguém ali passando no instante da conversa entre Frank e Carrie que denunciou anonimamente. - Tem muita sorte. - murmurou o Stein, largando-o como jogasse um saco de lixo - Só que não vai durar muito. - falou como ultimato e saíra correndo até o seu carro do mesmo modelo que o do original.

"A sua também vai acabar.", pensou Frank, tirando do bolso do sobretudo um pequeno rastreador para carros que possuía um imã que seria atraído pela lateria do carro. Apontou o aparelho - de mesmo tamanho e formato que um comprimido - para a porta do carona. O objeto "voou" em velocidade impossível de perceber e grudou no ponto alvejado.

Respirando com dificuldade, o detetive levantou-se, vendo seu adversário sair em disparada.

O barulho das sirenes aumentava cada vez mais atrás dele e uma sensação de impotência o torturava.

Desesperado, virou-se para onde as viaturas estavam vindo, querendo chamar a atenção para o sedã prata, àquela altura ainda visível, que corria a todo vapor até o fim da rua. O detetive balançava os braços e apontava para a direção específica.

- Ali! Ele foi pra ali!

Quatro policiais do DPDC desceram, um deles com algemas vindo à Frank.

- Não! Era um impostor, eu sou o verdadeiro Frank Montgrow! - disse ele, em sua defesa, sentindo-se ameaçado pelas algemas que chegavam perto de prender seus pulsos. - Olha, posso jurar pela minha vida, aquele carro que acabou de sair daqui é exatamente igual ao meu! Esse cara copiou até meu carro!

- Você tem provas disso? - perguntou o policial que o prendeu.

O detetive emudeceu, frustrando-se.

- Infelizmente, não. - falou, o semblante triste - É uma armação, precisam acreditar em mim...

- Tem a obrigação de ficar em silêncio. - disse o policial, rigoroso, conduzindo-o à viatura - Tudo o que disser a partir daqui será usado contra você no tribunal. Tem direito a um advogado.

Enquanto era levado, Frank, a face em estado de choque, só podia sentir o gelado metal das algemas provocar um eriçamento súbito dos pelos da sua nuca.

                                                                                          ***

O diretor abrira a porta da sala de Carrie com alarde, o celular em mãos.

- Boa notícia: Frank já está na sala de interrogatório.

A assistente o fuzilou com o olhar.

- Em que mundo isso é uma boa notícia? - questionou, aborrecida, levantando-se depressa da cadeira.

- Desculpe, não mencionei a possibilidade dele responder em prisão domiciliar. - informou Ernest, logo sentindo o vibrar do celular indicando ser uma nova chamada. Carrie não deu suspiro de alívio, mas a chance era até tranquilizadora. - Se a justiça for feita, na visão deles, a mancha na imagem do departamento pode ser amenizada. - atendeu a ligação. - Alô?

"Com justiça eles querem dizer condenação por julgamento... Frank ainda tem muita sorte por ser um agente especial, fosse um qualquer decretariam prisão temporária até o primeiro dia no tribunal.", pensou Carrie, resistindo o máximo que podia á seu instinto de roer as unhas quando a situação pressionava nervosismo.

A expressão que o diretor fazia durante a ligação só a deixava com mau pressentimento.

Errnest baixou o telefone, tapando o auto-falante.

- Má notícia: Frank nocauteou um vigia e escapou roubando um carro de um dos funcionários. - voltou à chamada - Obrigado por informar, Jake, até mais. - desligara, o sangue fervendo nas veias - O que aquele imbecil pensa que está fazendo? Já estava com a corda no pescoço, agora está prestes a ser estrangulado.

- Você ouviu todo o interrogatório? - perguntou Carrie, afligindo-se.

- O superintendente foi até lá, soube que ele disse ter posto um rastreador no carro que ele diz ser igualzinho ao seu. A história de que ele enfrentou seu gêmeo malvado é um conto da carochinha para os policiais.

- O mini-rastreador que lembro de você ter dado á ele ano passado... - disse Carrie, um pouco pensativa. Depois voltou seu olhar de pressa ao diretor - Você deve ter a senha, posso saber pra onde ele está indo.

- Calma aí, só um segundo... - disse Ernest, movendo rapidamente seus dedos na tela touchscreen. Após um instante, finalmente acessou a senha da qual nem lembrava mais - Aqui está. - mostrara à Carrie.

Memorizando os dígitos com eficiência, a assistente logo correu até seu notebook para rastrear o GPS de Frank bem como a direção do carro que ele estaria seguindo.

- Frank segue por uma estrada que vai à uma área residencial há 52 minutos daqui. Já o carro grampeado... - disse ela, digitando a senha - Aqui. - Ernest se pôs ao seu lado, curioso. Um círculo vermelho piscava para indicar que o carro do impostor parou em algum ponto da área - Rua 1115. Número da casa: 53. - um momento de reflexão a pegou sem que percebesse.

- Terra chamando Carrie... - disse Ernest, estalando os dedos próximo ao rosto dela.

- Ah sim. - disse ela, despertando - Esses números... Essa rua me soa familiar, algo me diz que o Frank já investigou um caso nesse exato local. Como estou na zona de perigo, melhor ir pra casa. - disse ela, pegando sua bolsa e apressadamente encaminhando-se à porta.

- O quê? Não entendi. - disse Ernest, seguindo-a.

- Preciso falar com Frank na zona livre que é onde fica minha casa. - disse ela, abrindo a porta. Virou-se para o diretor - Não se preocupa comigo, mesmo que eu não possa de impedi-lo de cometer uma loucura, podemos refrescar as memórias de um do outro sobre essa pista. - fechou, saindo rapidamente.

Duvemport mal conseguia conter dentro de si tamanha enervação que aquele imenso peso provocava. Passou as mãos no rosto, sentindo-se sem eira nem beira.

                                                                                        ***

O carro preto roubado seguia a toda velocidade por aquela estrada escura. Dobrou numa semi-curva fazendo uma nuvem de poeira subir. As mãos de Frank no volante suavam em abundância.

"Espero que quem encabeçou toda essa artimanha pra ferrar com a minha vida tenha um bom motivo pra fazer o que fez.", pensou Frank, sentindo uma revolta consumi-lo.

O toque do celular o tirou de seus devaneios movidos pela raiva.

- Alô? - disse após atender - Carrie, é você?

A assistente, àquela altura, já havia parado seu carro em frente à sua residência. Quando saiu fizera a ligação.

- Frank, seja lá o que estiver pensando em fazer, eu sugiro que desista. Você se tornou um fugitivo da lei, a Força Tática vai caçar você até os confins da cidade.

- Sem chance. Eu fiz o que julguei ser correto, por mais impulsivo que fosse; Não me orgulho disso, mas foi preciso. É minha única oportunidade de tirar essa história a limpo cara à cara com o cabeça dessa armação.

- Olha, me escuta... - disse Carrie, sentindo-se um pouco cansada ao fechar brevemente os olhos - É muita sorte eu ter chegado em casa e descobrir que você ainda está à caminho. Está com o GPS ligado?

- O GPS do rastreador. - disse Frank, olhando para o aparelho conectado ao GPS comum do carro. - Está me guiando até onde ele parou.

- Eu já sei onde ele está. É numa área residencial, rua 1115, casa número 53. Isso te soa familiar?

Uma torrente de arrepios assaltou o detetive. Parecia que um lampejo de lembranças tivesse sido acionado. Quase se esqueceu de que estava dirigindo.

- 1115... Tô começando a lembrar... Foi um caso... um caso sobre demônios. - disse, logo esbugalhando os olhos ao ter clareza das informações antes nebulosas - Aquele caso das gêmeas, Carrie! Uma delas se chamava Emily ou era Ashley, sei lá...

- As irmãs possuídas. Uma delas ligou pra você quando na verdade era o demônio querendo atrai-lo para uma armadilha. - disse Carrie, fazendo bom uso de sua ótima memória novamente - Foi há 3 anos, talvez um dos primeiros casos que você pegou. Tantos foram desse tipo nessa época que até entendo você não lembrar. Esses nomes também... Mas Ashley me parece mais provável de ser o real nome de uma delas.

- Olha, Carrie... - a fala de Frank tornou-se embargada de tensão - Acho melhor não falarmos mais nisso, vamos nos focar só em pegar o verdadeiro monstro.

- E se o demônio que viu for o mesmo que possuiu elas? - questionou Carrie, suspeitando da tentativa do detetive em desconversar. - Frank, raciocina comigo, não pode ser mera coincidência ele estar tão próximo de você e só agora, quando surge uma duplicata que está vinculada a casa onde você exorcizou esse mesmo demônio. Não sente as peças se encaixando? Essa é uma das melhores sensações que gosto de ter quando vamos fundo no mistério.

- Quer saber mesmo o que aconteceu naquela noite? - perguntou Frank, sentindo-se angustiado. O céu nublava-se sinalizando uma vindoura chuva passageira.

- Por que está me perguntando isso? - quis saber ela, franzindo o cenho, desconfiada.

- Porque não fui totalmente honesto com você. - disparou Frank, com firmeza - Eram duas irmãs gêmeas. Mary e Ashley... sim, são esses os nomes, sem dúvidas. Pra ser direto... eu... - os primeiros chuviscos começavam a cair, fazendo ele ligar os limpadores de para-brisa - Em dado momento, eu fiquei perdido, o desgraçado só queria jogar comigo e então...

- E então...? - indagou Carrie, ávida por saber, congelada de curiosidade.

- Então, eu... Acabei matando a Ashley por engano. - revelou Frank, comovido.

- Oh, deus... - surpreendeu-se Carrie, com um forte aperto no coração. - Isso explica muita coisa.

- Eu forcei essa memória falha só pra tentar esquecer que vivi aquela noite. - declarou Frank, a culpa voltando à tona com força total. - Provavelmente Mary, acho que era a mais velha, deve ter arquitetado isso como vingança. Em outras palavras, ela é uma descendente da tal civilização.

- Ótimo, mistério resolvido. - disse Carrie, empolgando-se de repente. - Não vou te culpar, você foi ludibriado, era um demônio trapaceiro, não precisa se torturar por isso. Eu vou até aí e...

A fala de Carrie foi interrompida quando a assistente recebeu um golpe por trás da cabeça através de um cassetete preto, caindo instantaneamente inconsciente no chão. A figura atrás dela era uma pessoa vestida inteiramente de preto com uma máscara de mesma cor, cujo olhos eram a única parte que deixava visível.

Frank estranhou a abrupta interrupção, mas não mentiu pra si mesmo quando lhe veio a certeza de ter escutado um barulho de um golpe bem forte.

- Carrie? Está na escuta? O que foi isso aí?

A figura sombria se aproximava lentamente para apanhar o celular com a mão coberta por uma luva negra. Ela, por fim, tirara a máscara, revelando ser uma linda garota de cabelos loiros cacheados.

- Sim, ela vai á minha casa. Eu mesma vou leva-la para um passeio. Ela voltar dele sã e salva só depende do resultado final.

- Essa voz... - disse Frank, estarrecido. A chuva se intensificou. - Vo-você... é a Mary Taylor. O que fez com a Carrie?

- Relaxa, só a pus para dormir. - disse ela, o tom debochante - Mas caso demore, ela pode ter um descanso eterno. Assim como minha irmã. Lembra do rosto dela? Da expressão de horror que ela fez quando enfiou aquela faca molhada com óleo sagrado?

- Eu me enganei. - disse Frank, tentando defender-se.

- Ou talvez o demônio estava em você e fingiu remorso quando o estrago estava feito. - acusou ela, irredutível, a expressão sisuda. - Mas compactuou das intenções dele, por isso não procurou esclarecer nada comigo depois.

- Olha, quer saber de uma coisa? Você deve ser tão paranoica quanto é boa em criar homens de lata. Eu vou salva-la e é bom não encostar em nenhum fio de cabelo dela. Tá entendendo? - disse Frank, adotando uma postura severa compreendendo a ameaça que Mary representava.

- Vou adorar ver você tentar me impedir. - provocou Mary, chutando o corpo de Carrie para vira-la já que havia caído de bruços - Vou chegar antes porque não quero perder o segundo round. - desligou.

Ao ver que a ligação foi encerrada, Frank pisou fundo no acelerador em meio à chuva quase torrencial. Uma descarga de adrenalina fora ativada em seu corpo ao se dar conta do perigo que Carrie poderia estar correndo nas mãos de uma mulher que, a julgar pelo tom, seria capaz de tudo para saciar sua vingança.

                                                                                        ***

Os olhos de Carrie abriam-se lentamente apresentado uma visão borrada e turva de um local que emanava velhice e com ambiente preenchido por um odor pesado de mofo e poeira.

A assistente gemia enquanto despertava. A primeira coisa esclarecida que viu foram suas mãos presas por cintas de couro bem amarradas. Sentiu o peito também amarrado pelo mesmo material e as têmporas com eletrodos grudados numa esponja molhada com água misturada a sal. A dor atrás da cabeça latejava de dois em dois segundos aparentemente. Ao erguer os olhar para frente, viu Mary abrindo o grande livro de comandos que herdara por direito.

- Ah, então é você... - a voz de Carrie gradualmente tornava-se menos fraca e menos arrastada - Você é uma Anakon.

- E você minha prisioneira. - retrucou Mary fazendo pouco caso da situação - Também a pessoa que ele mais ama. Não é?

"A que ele mais ama?!"

- Olha, não sei que tipo de insanidade planeja fazer comi... - cortou a frase ao visualizar à sua esquerda um painel de alavancas para eletricidade. Isso a fez despertar por inteiro, graças também à revolta - Uma cadeira elétrica?! Genial... Vai ameaçar me fritar se o Frank não chegar a tempo.

- Em 10 minutos pra ser exata. - disse Mary, encarando-a com as mãos apoiadas na mesa - Ou ele coopera ou você se junta à minha irmã. Ele desgraçou minha vida tirando a coisa mais importante que eu tinha, nada mais justo do que tirar a coisa mais importante da vida dele.

- O que te leva a considerar que eu ser alguém relevante pro Frank justifica eu ter que estar aqui?

- Minhas fontes, meus estudos. - disse ela, soando misteriosa, levantando uma sobrancelha com ar soberbo. - Todo esse tempo dediquei minha vida a esse plano e não vou descansar até chegar ao fim.

- Então admite que esteve espionando o Frank? - pressionou Carrie, desafiadora.

- Eu sou a captora, sou eu quem devia fazer perguntas. Mas sendo generosa: Sim. Existe alguém no departamento de polícia que me deu uma colher de chá e me poupou bastante. Ele me chamou de paranoica, você também deve ser já que lendo-a pela aparência também não dispensa uma boa conspiração ou um mistério suculento.

- Eu pareço paranoica pra você? Faça-me o favor... - disse Carrie, não afastando o pensamento sobre o aliado misterioso de Mary. "Só pode ser aquela falsiane da Megan! Ligada às Indústrias Crissman e agora a uma psicopata vingativa... Essa noite tá ficando cada vez melhor." - Se vou morrer aqui, morrerei por Frank. Ele agiu com ingenuidade, o demônio manipulou toda a situação para pega-lo.

- Ingenuidade não é o mesmo que inocência. - destacou Mary, o olhar colérico - Vou lutar para fazer a justiça acontecer, é uma causa nobre pela memória da Ashley.

- Colocar sua vingança estúpida na frente de várias vidas inocentes é muito nobre. - ironizou Carrie, não escondendo seu repúdio pela frieza cristalina da garota.

- Os fins justificam os meios. - redarguiu Mary, sorrindo cinicamente.

Carrie balançava a cabeça, enojada.

- Talvez a Ashley era uma pessoa bem mais digna de estar viva.

Barulhos de passos ecoaram em aproximação. Mary voltou sua atenção para a escadinha que permitia a entrada, logo sorrindo presunçosamente.

- O show já vai começar. - disse ela, sentindo-se juíza no combate que decidiria se Carrie sairia viva ou morta.

A figura troncuda de Frank irrompeu das sombras em uma postura insegura. Os olhos de arrependimento genuíno fixaram-se naquela jovem amargurada e corrompida pelo ódio. "Tem que existir um jeito disso terminar sem mortes. Ela não tá pra brincadeiras. Vou ser cauteloso e tentar do meu próprio modo, preciso tocar o coração dessa menina custe o que custar.".

- Frank... - disse Carrie, animando-se contidamente ao vê-lo - Como pode ver, minha vida é a moeda de troca.

- Solta ela, Mary. Vamos conversar. - pediu Frank, fechando os olhos por um segundo, seriamente focado. - Eu posso sair daqui sem seu perdão, mas não vou sem a Carrie.

- Ou pode sair bem machucado. - provocou ela, olhando de soslaio para uma porta escancarada que ficava poucos metros de distância da escada. - Já eu não sairei sem ver você ter o que merece. A morte é boa demais pra você, então imaginei que a forma ideal de fazer minha justiça era desgraçando a sua vida de uma forma pior do que fez com a minha. A humilhação, a sensação de fraqueza... - sorriu de canto  -... quis fazê-lo pagar em dobro todo o sofrimento que me causou. Essa é a justiça que quero fazer.

- Chama isso de justiça?! - disse Frank, enervando-se - É justiça pessoas inocentes morrerem como se não fossem nada por causa de uma pessoa que não saiu do segundo estágio de luto!? O demônio gosta de despertar a raiva mais profunda nas pessoas com suas travessuras, e pelo visto não foi diferente com você. Nós fomos vítimas nisso, Mary. - disse, apontando para si e para ela com rapidez. - Nós fomos enganados! Aquele demônio pregou uma peça cruel na gente, foi tudo parte do plano maquiavélico dele. Tenta entender isso.

- Frank, não gaste sua saliva com essa garota, ela é uma psicopata, saca as algemas antes que o T-800 venha. - disse Carrie, logo em seguida tendo um lampejo de teoria - Ou talvez... talvez o demônio esteja nela!

- Pior que eu não trouxe óleo sagrado, nem água benta. - disse Frank, encarando-a sério. Ergueu a mão direita, esticando o braço - Mas não quer dizer que não possa tentar. - falou, desafiante.

- O que vai fazer? - perguntou Mary, olhando-o com chacota - Que idiota, vocês devem saber que um Stein só pode ser controlado por um Anakon, devem ter visto algo numa wikipédia de quinta categoria. Eu tenho sangue descendente. Se eu tivesse um demônio usando meu corpo minha criatura só seria um homem de lata sem rumo. E aí? Satisfeitos?

- Pior que parece fazer sentido... - disse Carrie, decepcionada - Esquece o exorcismo, Frank, ela é uma psicopata mesmo, pra isso aí ou é cadeia ou quarto branco.

- Cala a boca senão vou até aí e faço churrasquinho de você, sua vadia! Devia ter fechado sua boca com uma bola de meia suja! - bradou Mary, irritada. Voltou-se para Frank depois, alterando a expressão para um misto de raiva e tristeza - A Ashley era tudo o que tinha, éramos inseparáveis. Após a morte dos nossos pais, só tínhamos uma a outra. Ás vezes dias sem comer, dias sem dormir ou falar com pessoas. Infelizmente, o privilégio que carrego no meu sangue não consegue trazê-la de volta. Que outra escolha eu teria que fazer?

- Ser forte e tentar seguir em frente, era o mínimo. - aconselhou Frank, tocado pela emoção - Sei que sofreu, mas escolher o ódio não é algo de que se deve orgulhar. Imagina como sua irmã se sentiria?

- Eu imagino a Ashley todos os dias. - disse Mary, derramando uma lágrima - Só o que vem à cabeça é a imagem dela em meus braços agonizando com a ferida sangrando. Não quer contar pra sua amiga como foi? Tenho certeza que ela vai adorar saber. Tenho mais certeza ainda de que se lembrou de cada detalhe no primeiro segundo que ouviu minha voz.

As palavras estavam entaladas na garganta. A apreensão de Frank aumentava, mas não chegando a impedi-lo de narrar resumidamente os fatos.

- Quando eu cheguei... fui logo jogado contra a parede. Tinha uma garota vindo, era a Ashley, então pensei ser o demônio e que o lance de irmã possuída era uma cilada. Achei que era um dos que queria se vingar, é difícil distingui-los. A Ashley realmente estava possuída, pude constatar. Joguei água benta, ele recuou. Depois as luzes piscaram até o blecaute total, na rua toda, o bicho era poderoso e fiz ele ficar irritado. Num corredor encontrei a Mary, foi aí que percebi ser verdade. Ela tinha deslocado o ombro por causa do demônio. Ouvimos gritos da Ashley. Procuramos por quase toda a casa.

- E você teve a péssima ideia de nos separarmos. - disse Mary, mantendo-se acusadora.

- Isso foi uma deixa para o demônio pegar a Mary. Encontrei ela desmaiada no quarto da Ashley que estava sentada num canto, assustada. Daí a confusão começou. Perguntei se o demônio tinha deixado a Mary inconsciente ou se tinha saído dela e se escondido, mas ela mentiu dizendo que só viu a Mary entrar e desmaiar. Uma mentira bem forçada, por sinal. Eu ia verificar o pulso da Mary, mas joguei água benta nela antes. Mas fui pego com guarda baixa - ergueu os olhos sérios para Mary - quando a Ashley quebrou uma garrafa de uísque e tentou me atacar com o gargalo, crente que eu estava possuído. - fez uma pausa, as palavras barradas pela comoção - Segurei o braço dela... e enfiei a faca sem pensar duas vezes. - apertou os olhos e mordeu os lábios, sofrendo internamente com o arrependimento - Não aconteceu o que eu esperava. No mesmo instante, Mary acordou e me viu com a faca e Ashley caindo no chão.

- Me debrucei sobre o corpo da minha irmã e ele ficou lá parado, forçando um estado de choque. - disse Mary, estreitando os olhos para o detetive - Gritei pra ele sair e o chamei de assassino. Senti vontade de pegar o gargalo e eu mesma cortar a garganta dele, mas me controlei e algo me dizia... - arqueou as sobrancelhas - ... para esperar a hora certa de fazer da maneira certa. Foi quando lembrei da vantagem que corre no meu DNA. Tirei o Orb do baú e canalizei todas as lembranças ruins desse dia pra ele pra que quando eu o transformasse no cérebro e coração, o meu Stein copiaria seus trejeitos através dessas memórias. É assim que se faz.

- Bastava compartilhar memórias com o Orb para o T-800 agir como o Frank?! - disse Carrie, não escondendo seu espanto - Espera aí! - falou, sua voz elevando-se após uma ideia - O que garante que você seja a verdadeira Mary?

- Insinua que sou um Stein? Que piada de mau gosto. - disse Mary, quase deixando escapar uma risadinha sarcástica - Só existe uma Mary Taylor para se vingar de Frank Montgrow. - declarou, virando o rosto para o detetive.

- Só vou pedir mais uma vez. - disse Frank, categórico e sem mais traços emotivos na face - Deixa a Carrie fora disso. Não precisa tirar mais nada de mim quando já tem um brutamontes de metal que pode arrancar meu couro. Mas daí você acha a morte boa demais pra mim, então eu prefiro apanhar do que ver minha melhor amiga - apontou para Carrie com o indicador esquerdo - ser sacrificada numa cadeira elétrica! - olhou para o lado com mais atenção, logo franzindo o cenho - E que tipo de gente põe uma cadeira elétrica num porão?

- Do tipo que adora fazer cócegas em Steins. - respondeu Mary, sucinta - Assim era o meu bisavô, essa casa foi habitada por três gerações da família. Ele costumava alimenta-los com eletricidade, os deixava mais resistentes e mais ágeis. Fiz isso hoje de manhã no meu. - disse ela, olhando rapidamente para a porta entreaberta - Bem, chega de conversa. Vai ter que seguir minhas regras.

- Eu devia prende-la agora mesmo. Olha a distância entre mim e você e você e a Carrie. - disse Frank, mostrando-se desafiador. - A algema pega no seu pulso antes do primeiro passo, já vou avisando.

- Vejo que desistiu de mendigar perdão, era só uma fachada, esperava que o abraçasse, daí me prenderia. Não sou tão estúpida. - falou ela, com repúdio intenso.

- Desiste, Frank. - disse Carrie - Não dá pra dialogar com uma pessoa dessas. Palavras não convencem psicopatas. Você vai continuar se arrependendo de ter julgado a Ashley cedo demais e ela vai continuar batendo na mesma tecla de que você é quem estava possuído quando a matou. E não estava!

- Não estava mesmo. - defendeu-se Frank, erguendo de leve as duas mãos.

- De qualquer forma, não há como provar. A primeira impressão é a que fica. - disse Mary, ardorosamente inflexível, virando uma página do livro. - Ele podia ter jogado água benta, mesmo que fosse atacado, pra ter certeza, mas nem isso ele fez.

- Àquela altura do campeonato, eu já estava jogando o jogo sádico do demônio. Era óbvio que se Ashley tentasse me ferir eu iria revidar, pois o demônio estaria mirando nas duas e não em mim.

- Olha, já cansei dessa lenga-lenga toda. - esbaforiu-se Mary, batendo suas mãos na mesa - Você é um a-ssa-ssi-no e vai seguir conforme minhas regras a partir de agora! - decretou, com todo o seu ódio manifestado - Se você vencer, pode sair da cidade pra recomeçar sua vida como uma nova pessoa, eu construo um outro Stein 10 vezes mais fiel que o original que vai se entregar à polícia. Se perder, sua amiga vira pó e você vai ver o sol nascer quadrado.

- Sair da cidade? Recomeçar minha vida? Mas nem a pau! - reclamou Frank, cansado de bancar o bonzinho para aquela garota que se negava a entende-lo por puro ego. - Eu tenho uma missão a cumprir. Um legado a honrar.

- Também tenho minha missão. Acabar com o homem que matou minha irmã. - disse Mary, sentindo a presença forte do seu Stein chegando perto - Não eu, mas ele.

Frank virou o rosto para sua direita como que por reflexo. Um vulto robusto abria a porta e andava em direção ao detetive, logo sendo iluminado pela única lâmpada que estava acima de Mary. Um clone de Frank com uma expressão exageradamente sisuda como ele nunca esboçaria.

Carrie mau sentiu sua boca abrir-se em estupefação.

- Admito: Você é uma piranha psicótica, porém caprichou na fidelidade.

- Carrie! - disse Frank, olhando-a com reprovação na voz e na face.

- Ahn... quero dizer... Acaba com ele, você consegue. - disse ela, abrindo um sorriso nervoso.

- Você de novo. - disse o Stein, a voz rude e rosnante.

- Digo o mesmo. - retrucou Frank, olhando-o de baixo à cima - Aposto que você também não queria estar aqui. Se concorda comigo, vamos dar as mãos e nos abraçar e tudo isso acaba bem.

Uma atmosfera silenciosa constrangeu o detetive que viu sua patética tentativa de selar pacificidade ser encarada pelo semblante endurecido de sua duplicata.

- OK. - disse Frank, assentindo, sem escolha a não ser ceder ao desafio - Não pense que vou me conter. - falou, fechando o punho direito e desferindo um soco contra o rosto do Stein que simplesmente virou-o para o lado. A reação instantânea veio na forma de uma dor lancinante nos ossos da mão. - Ai, ai, ai... - se virou para trás apertando firme a mão doendo.

- Começou mal. - zombou Mary. Era o momento exato para comanda-lo. Pousou seu indicador direito na página, passando-o pelos hieróglifos enquanto lia em voz baixa. Carrie a observou.

O Stein, após a leitura de sua criadora, erguera os braços e pegara Frank pelas costas, brutalmente arremessando-o contra uma parede de madeira que se despedaçou por inteiro com o impacto.

- Frank! - gritou Carrie, preocupada.

O detetive se ergueu aos poucos dos pedaços de madeira, logo pegando uma tábua e golpeando-o contra o rosto de sua "versão robótica" duas vezes nos dois lados. O pedaço se desfez completamente, sem provocar nenhum dano visível. O Stein deu alguns passos adiante, logo socando-o uma vez e em seguida pegando-o com uma só mão pela gola da camisa por baixo do sobretudo e o colocando-o contra uma parede de tijolos. Ao solta-lo, desferiu uma sequência de cruzados de esquerda e direita.

Carrie fechava os olhos, aturdida com os ruídos fortes dos socos. Mary eram só sorrisos direcionados ao êxito de sua cria.

O rosto de Frank sangrava dos dois lados com hematomas que se agravavam a cada golpe.

No último soco, o detetive desencostara da parede, ficando em posição quadrúpede para cuspir alguns bolões de sangue. Sentiu a perna direita do incansável Stein rapidamente baixar seu corpo contra o chão, pressionando sua coluna vertebral dolorosamente. O gemido sofrível do caçador torturava Carrie psicologicamente. Com um dos olhos apertados, Frank entreviu um objeto que possuía uma espécie de cano de finura conhecida.

- Sugestão para agilizar o trabalho: Aperte um braço até quebrar todos os ossos.

- Não! - vociferou Carrie - Se quer vê-lo morrer, então faça você mesma! Ah, já sei, aquela vontade se transformou em covardia!

- Você é uma idiota. Disse que a morte dele não é o suficiente para aliviar minha dor. - disse Mary, voltando seu rosto para a luta - Só quero vê-lo sofrer lentamente até implorar.

O Stein pegara o braço esquerdo de Frank, forçando o ombro, passando a usar o joelho na pressão contra a coluna. O gemido do caçador tornou-se um grito rápido de dor. Recompôs a insistência no objeto à sua frente que vira com mais clareza. Era um maçarico que estava no armário de ferramentas que caiu depois de Frank ser jogado. Convenientemente, um isqueiro que guardava havia caído quando ficou em posição de quatro.

Pegou o isqueiro, acendendo-o e empurrando-o até a ponta do maçarico que acendeu num segundo fazendo brotar uma chama azulada. O detetive tentou esticar seu braço o máximo que conseguia a fim de alcançar o maçarico, tentando ignorar a dor que infligia-se em suas costas e braço.

Seus dedos alcançaram-o até chegar totalmente à mão. Em um ato que julgava improvável, Frank jogara o maçarico aceso para trás, esperando ter mirado no rosto do Stein.

A chama penetrou violenta no lado esquerdo do rosto da criatura mecânica, afastando-o de Frank numa distância segura o bastante para que o detetive pudesse ter espaço para contra-atacar.

"Ele fez um ponto, já era tempo", pensou Carrie, querendo roer as unhas assistindo aquele vale-tudo entre homem e "máquina".

Cambaleando de leve, o Stein grunhira sentindo as brasas consumirem a pele artificial. Com Frank levantando-se, ele mostrara a metade de sua falsa face corroída pelo fogo, consequentemente deixando à mostra o metal prateado e chamuscado que compunha sua cabeça. O olho era apenas uma órbita circular e vazia.

O detetive pegara uma barra de ferro próxima à ele, fazendo-a subir com o pé e levando-a à mão direita, segurando-a firmemente para logo depois desferir um golpe contra a metade metálica do rosto do oponente, em seguida outro na metade "humana". Por último, daquela sequência, golpeou-o no queixo com a ponta da barra de aço, fazendo-o cair para trás com maestria.

Aproximando-se dele, Frank mirava a ponta de sua arma improvisada para o pescoço do Stein até toca-lo com ela, fortificando a ameaça.

- Últimas palavras? - Frank sentia o gosto saboroso da vantagem na boca, além do sangue de seus ferimentos logicamente. - Tem uma coisa no seu rosto... É sangue ou óleo?

Os pés do Stein, contudo, o pegaram com a guarda baixa ao fazer uma rasteira que o derrubou com violência contra o chão, logo levantando-se depressa e chutando Frank na barriga repetidas vezes. Por sorte, o detetive reconquistou proximidade com a barra que soltara devido ao imprevisível golpe anterior. Pegara a barra com as duas mãos, reunindo o máximo de força para aquele atraque decisivo.

Antes que ele o pegasse pelas costas novamente, Frank virou-se, reerguendo-se com a mesma rapidez que cravara a barra diretamente na parte central do peito do Stein.

- Hasta la vista, baby. - disse Frank, vanglorioso, empurrando-o com a barra fincada no local alvejado. Do ponto quebrado via-se um círculo de luz verde tremeluzir incessantemente.

Mary fitava a volta por cima do detetive com perplexidade amalgamada à frustração total. Carrie, por outro lado, conseguia formar um sorriso de satisfação mesmo temendo uma investida impulsiva de Mary que a colocaria num flerte súbito com a morte.

O Stein foi empurrado até uma parede, fitando Frank com seu olho "humano" congelado de temor e a boca arfando constantemente. Até, por fim, cair com as costas roçando na parede e não expressar quaisquer sinais de vida. O sentimento de vitória por ter vencido uma cópia sua era demais para o coração do detetive que viu a luz do Orb apagar-se. Retirou a barra de aço, a mesma fazendo um barulho rascante como o de uma espada sendo desembainhada, logo jogando-a no chão fazendo um tilintar metálico.

- Não!! Mas que droga!! - reclamou Mary, batendo suas mãos na mesa em profunda raiva. Ergueu um olhar de ira para Frank. - Como pôde?

- O ponto fraco da sua lata velha era muito óbvio. - disse Frank, andando uns passos à frente, o rosto bastante machucado. - Esse Orb piscava cada vez que ele me socava, como se fosse uma resposta às reações dele. Ele é osso duro, mas só precisava de uma brecha segura.

O descontrole da derrota criava uma ebulição no sangue de Mary.

- Agora solta ela. - exigiu Frank, sacando as algemas caso ocorresse o contrário - É a última vez que peço, a última mesmo. - falou, o tom severo.

- Vou liberta-la. - disse Mary, a fala mansa, andando em direção à sua prisioneira. No entanto, o tom usado não passava de uma simulação. - Vou liberta-la da sua convivência... e deste mundo. - mirou seus olhos na alavanca para ligar a tensão elétrica de aproximadamente 3.000 volts.

- Não, espera aí! - disse Frank, desesperando-se e querendo intercepta-la. Carrie estava quase se debatendo na cadeira em um instinto de lutar por sua vida.

Algo inesperado pegara os dois de surpresa de forma assustadora.

Uma mão, irrompida da escuridão, puxara Mary para trás de forma bruta, depois soltou-a e em um segundo Mary estremeceu o corpo como se estivesse sendo eletrocutada. Um inconfundível ruído de eletricidade denunciou ser um taser.

Após Mary cair inconsciente, a figura revelou-se para a dupla que estava paralisada de curiosidade.

Um homem de meia idade vestindo um terno preto com gravata vermelha... e usando um broche que estampava o logotipo do DPDC.

- Diretor!? - disseram ambos em uníssono, espantados.

Duvemport escondeu a arma de choque, desligando-a, sentindo-se desconcertado.

- Pra quê tanto alarme, meus amigos? - indagou, olhando-os com uma face meio brincalhona. - Ernest Duvemport nunca perde uma boa briga e uma boa chance de ser um Deus Ex-Machina.

Frank correu para desinstalar os eletrodos de Carrie e desamarra-la.

- Inacreditável... - disse Carrie, libertando-se das cintas de couro - Mas... O senhor veio me seguindo?

- Não você. - disse o diretor, tranquilo e sem arrepender-se do que fez - Ela - olhou para Mary - Na verdade, estive aqui desde que Frank chegou. Eu ouvi tudo.

- O quê? O senhor ficou escondido esse tempo todo? - questionou Frank, franzindo o cenho - Podia ter dado uma mão.

- E encarar esse golem?! Além de dois contra um não valer, eu apoio uma luta de igual pra igual.

- Essa lata velha tem a mesma aparência que eu, não quer dizer que eu seja tão forte quanto ela. - argumentou Frank, aparentando insatisfação por saber do posicionamento do chefe quanto ao caso. - Olha... - coçou a cabeça, ao mesmo tempo sentindo os hematomas doerem - ... realmente achou que ele fosse eu?

O diretor mostrou sensibilidade.

- Infelizmente, sim. É verdade. Acreditei que tinha surtado.

- O verdadeiro cérebro psicótico dessa situação não passa de uma mulher que se deixou consumir pela vingança. - disse Carrie, olhando para Mary com desprezo. Se agachou-se, aproximando sua boca ao ouvido dela - Se ferrou... vadia.

- Me desculpe, Frank. - disse Ernest, apertando a mão do subordinado - Sei exatamente como recompensa-lo.

- Não preciso de aumento, já ando satisfeito com meu lucro. - disse Frank, bem-humorado.

- Quis dizer sobre sua situação. - disse ele, levantando uma sobrancelha - Se há alguém que vai apodrecer numa cela até a morte... é esta diabinha.

- Se tem um plano, então diz logo. - disse Carrie, ansiosa - Como pretende limpar a bagunça do Frank?

- Estão olhando para um expert em livrar amigos de ciladas. - garantiu Duvemport, seguro de si.

- Vê lá o que senhor vai fazer, hein. - disse Frank, tocando-o no ombro e andando para sair dali. Carrie o acompanhou.

- Hum, não perdem por esperar. - disse Ernest, parecendo prometer algo realmente eficaz. Virou-se para a dupla, fazendo-os parar para ouvi-lo. - Nós formamos um belo time, não acham?

Frank e Carrie entreolharam-se meio incertos.

- Ahn... É, a gente dá pro gasto. - declarou Frank, dando um sorriso fechado para o chefe.

- É isso aí. Um viva para a equipe Duvemport.

- Que nome brega. - reprovou Carrie, comicamente provocando-o - Se fosse assim, preferiria seguir carreira solo.

- Tipo, você caçadora? - perguntou Frank, achando engraçado - Eu pagaria pra ver. - olhou para o diretor que lhe retribuiu um sorriso concordando com a zoação.

- Apostariam alto é? Quem viver verá. - disse Carrie, com plena certeza de não medir riscos quanto a possível empreitada.

                                                                                           ***

Frank terminava de encaixar o Stein em seu pequeno porta-malas, tendo a sensação de ser um assassino que recolher o cadáver para esconde-lo no carro. Mas nada comparado ao peso irretirável pelo assassinato de Ashley. O detetive apoiou uma mão na porta traseira, fitando o homem de aço, o sósia fielmente criado à imagem do original.

Carrie se aproximava dele, com as mãos nos braços sendo acometida pelo frio da madrugada.

- Percebi que precisava de companhia. - disse ela, dando uma olhadela no Stein.

- É, preciso. - respondeu Frank - Além de band-aids e uma compressa de gelo. - disse, fazendo-a dar uma risadinha.

- Quão útil essa sucata vai ser na sua vida? - perguntou ela, estranhando a ideia do amigo de se apoderar da criação de sua inimiga.

- Como uma lembrança. - disse Frank - Afinal, coleciono bugigangas sobrenaturais, então nada fora do serviço. - olhou para a assistente - Penso até em um dia revivê-lo.

- Usar um Stein em benefício próprio é impossível nessas circunstâncias. - disse Carrie, fitando-o - Você danificou o núcleo do Orb, e pedras como essas são extremamente raras. Nessa condição, nem eletricidade é capaz de ressuscita-lo. Só vai estar guardando um boneco de metal coberto de ferrugem.

- Por mim tudo bem. - disse Frank, dando de ombros - Nada que umas latinhas de refrigerante não resolvam. - falou, arrancando uma risadinha da colega - Quem diria né? Um homem de lata ter um coração tão frágil quanto o de um humano.

- E a fabricante ter um cérebro tão limitado quanto o dele. - complementou Carrie.

Ambos riram. No entanto, uma curiosidade martelava a cabeça de Frank.

- Mas sabe... Não tô conseguindo engolir esse mistério que o diretor tá fazendo sobre limpar minha barra. Tomara que ele aja de forma que não deixe rastros.

- Parece que minha curiosidade descontrolada é contagiosa. - ressaltou Carrie, o tom de satisfação.

Enquanto esperavam o diretor retornar após fazer o que tinha idealizado, as nuvens carregadas dissipavam-se expondo um céu repleto de estrelas.

                                                                                         ***

Na manhã seguinte... 

A TV de LCD do largo corredor principal do DPDC mostrava a notícia que era de cobertura exclusiva da maior rede de televisão da cidade. Na reportagem estava uma gravação de Mary sendo levada algemada pelos policiais, visivelmente alterada pelas acusações, mas mais ainda pelas provas achadas em sua casa em uma vistoria estimulada por denúncia anônima.

- Tem que estar havendo um engano! Vocês não sabem mais do que eu! Frank Montgrow é um assassino! Ele matou minha irmã mais nova! Dá um close aqui em mim, por favor! Vocês, agentes do departamento, que assistindo isso, prestem atenção: O homem com quem vocês trabalham tem um segredo... - seus olhos fixaram na câmera.

- Que tipo de segredo? Está a par de alguma informação confidencial a respeito do agente Montgrow? - perguntou a repórter.

- Sim. Acontece que ele é um... um caçador. Ele não é inocente. Ele caça monstros.

- Monstros? Coisas sobrenaturais? Está insinuando que ele possui uma vida dupla baseada no sobrenatural?

- É claro que sim. Quando minha irmã foi possuída por um demônio, ele a matou covardemente, mas meu palpite era de que o demônio estava nele e...

- Tudo bem, mocinha, já falou muita bobagem... - disse o policial, tirando-a do foco para conduzi-la.

- Bem, pelo que podemos ver, Mary Taylor está veementemente convencida de que um dos investigadores do DPDC preserva um segredo de cunho surreal. Sua prisão foi decretada quando a polícia encontrou uma máscara tecnológica com 100% de eficácia de disfarce, além de resquícios de pele artificial  e perucas masculinas. A identidade do cúmplice de Taylor que se passou pelo agente Montgrow, e verdadeiro responsável pelas mortes de mais de 56 pessoas, civis e policiais, em cerca de 12 ataques em apenas dois dias, permanece desconhecida, mas sua busca e captura não estão fora de cogitação. Embora tenha sido automaticamente inocentado do caso após as descobertas, Montgrow ainda terá de prestar um depoimento a porta-vozes do Conselho de Segurança. Eu sou Melanie Roscoe, diretamente da área nobre de Danverous City à DTV.

Assistindo à transmissão ao vivo, Megan ajeitava seu óculos de armação fina e quadrada, a expressão bastante séria.

Alguns minutos depois, chegara à sala do diretor. Antes de entrar, certificou-se de não haver ninguém por perto. Convencidamente segura, girou a maçaneta, logo entrando em silêncio.

Os saltos de seus sapatos faziam barulho leve - enquanto ela andava em direção à mesa de Ernest.

Ao abrir o notebook, sacou do bolso de seu bem sobretudo cinza uma espécie de mini-roteador. Em resumo, um minúsculo cubo preto com uma antena. Em um dos lados do cubo despontava um cabo semelhante ao USB, podendo ser plugado em qualquer laptop. A antena vibrou com a conexão.

Na tela surgiu um diretório. Megan, tranquilamente sentada na confortável cadeira de couro do diretor, clicara fazendo abrir uma janela com fundo preto. Um medidor de frequência surgiu, indicando tratar-se de uma transmissão de áudio. A secretária ajustou o microfone sem fio, preso ao sobretudo, ligado ao dispositivo de forma cúbica.

- Sinal vermelho. - disse ela - A garota é uma estúpida, fracassou na missão e acabou sendo presa. Agora que Frank se livrou de um problema, isso significa mais problemas... pra nós.

- Assegurou que era de sua confiança, que o anseio dela por vingança iria contra todas as probabilidades de fracasso. - disse a voz, fazendo "levantar" várias das linhas verticais da frequência, submetida a sintetização que lhe dava um ar sinistro. - A sua decepção com ela não se compara a minha com você.

- Sim, eu entendo, estraguei quase tudo. No fundo algo me dizia que ela e sua vantagem hereditária não daria conta do recado. Qual é o próximo passo?

- Eu receio que agora fica por sua conta. - sugeriu a pessoa oculta - Se quer tanto que Frank Montgrow não dê um passo além da fronteira... vai ter de provar ser boa numa missão solitária.

- Eu sempre fui sozinha. Sempre ganhei sozinha. - disse Megan, gabando-se.

- Então é chegada a hora de mostrar do quanto é capaz. E faça de tudo para que ele nem sequer veja a cor dessa maldita arma, em hipótese alguma facilite o acesso à ela. Lembre-se que esse homem cumprir seu legado representa uma obstrução nas nossas ações que não poderemos corrigir.

- Nunca me disse porque esses estudos nessa tal besta são tão importantes. - disse Megan, sabendo que soou indelicada.

- Sem querer menospreza-la, mas há certas coisas que devem se manter desconhecidas de lacaios do seu nível. Mais ainda de nossos alvos mais específicos. Se quer uma sugestão para seguir: Comece desconfiando das pessoas mais próximas de Frank.

- Já tenho uma em mente. - disse Megan, imaginando a figura de Carrie, com um sorriso suspeito.

- Ótimo. Se esforce para estar a um passo à frente dela. No entanto... caso um atrito se crie, não hesite em elimina-la. É até bom que isso aconteça. Talvez assim, com uma de suas pessoas que mais se importa no ambiente de trabalho removida da equação, Frank encontre uma oportunidade de chegar até nós nessa trágica cadeia de eventos.

                                                                                          -x- 


*A imagem acima é propriedade de seu respectivo autor e foi usada para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos. 

*Imagem retirada de: https://wall.alphacoders.com/by_sub_category.php?id=211287&lang=Portuguese



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