Contos do Corvo #30

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O corvo parecia estar analisando a reação do coveiro após ter contado uma versão pouco conhecida da famigerada Bloody Mary.

- É, parece que fisguei o adorador de histórias minhas que tinha dentro de você esse tempo todo. - disse ele, convencido.

- Larga de ser iludido, seu agourento. - retrucou o coveiro, desfazendo a postura de interessado - Pra falar a verdade, essa nem pareceu tão boa assim, parece só uma das muitas lendas que você tira da sua bunda. E pouco me importa quem é esse tal Frank.

- Eu só queria entender plenamente uma coisa: Por que mesmo com essa rejeição toda por mim ainda continua aqui parado na minha frente me ouvindo? Opção 1: Você não quer decepcionar a garota órfã e finge se interessar por minhas histórias já que do contrário magoaria ela, embora ela não obrigue o senhor a ficar já que gosta da sua companhia. Porém, essa opção é descartada com a mais plausível, a opção 2: O senhor finge não gostar pois mesmo com a ausência dela permanece no canto e como não tem nada melhor para fazer da vida a não ser enterrar cadáveres putrefatos acaba sem escolha. Se odiasse tanto minhas histórias, preferiria o tédio da própria vida a realmente ficar estagnado suportando minha presença e a minha voz na sua cabeça. Quem está com a razão agora, velhote?

- Olha aqui, seu...

A réplica que o coveiro daria à ave tagarela foi interrompida abruptamente pela chegada repentina da garota, balançando suas tranças laterais que iam até suas mãos.

- E aí, amigos, o que eu perdi?

- Praticamente nada. - disse o coveiro, resmungão.

- Mentira. Quer ouvir a nova? O velhote aqui ficou todo errado quando expus meu ponto de vista sobre o falso ódio dele por mim. Se tivesse ouvido, teria concordado.

- Para de manipular a menina, seu verme. - disse o coveiro - Sobrevivi a duas histórias suas porque realmente não tenho nada melhor para fazer nessa minha vidinha patética.

- Disse que a vida dele é patética? - perguntou a menina, olhando com descontentamento para o corvo.

- Não disse que é patética. Só falei que ele não faz outra coisa da vida senão cuidar de cadáveres.

- E você contou duas histórias pra ele? É verdade?

- É, foi. Pena você ter perdido. Mas não faz mal, o velho te conta amanhã. - sugeriu o corvo.

- Nem pensar! - disse o coveiro arregalando os olhos em ira.

- A não ser que ele tome as pílulas para lembrar de tomar as pílulas para se lembrar do que falei. Se é que ele lembra que tem pílulas ou se tem de fato pílulas de memória. - zombou ele, sarcasticamente.

O coveiro rosnou prestes a golpeia-lo com sua pá, mas a menina o segurou pelo braço calmamente.

- Espera, não faz isso.

- Já disse que ele se quiser vazar, vai em frente e se não quiser voltar nem que seja por você, também não me importo. - disse o corvo - Sempre vai haver alguém na fila disposto a me ouvir.

- Olha eu aqui. Devia contar uma nova agora. Mas veja bem hein: Tem que ser boa pra compensar as que eu perdi.

- Deixa eu vasculhar aqui na minha mente... ahn...

- Façam o que quiser, eu tô dando o fora. Dessa vez não tem volta, cansei de ouvir baboseiras de um pássaro sobrenatural, eu sou um idiota, vai à merda! - disse o coveiro, jogando a pá com raiva. A menina o observou com certa tristeza no olhar.

- Ah, já sei, lembrei. - disse o corvo, ignorando descaradamente a saída do coveiro - Deve ter escutado a clássica história da garotinha Alice, aquela que segue um coelho branco e acaba caindo num mundo surreal. Essa história aconteceu aqui mesmo nessas terras britânicas...

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                                                                           A TOCA DO COELHO

A garota desse caso se chama Alice, essa é apenas uma das poucas semelhanças com a história clássica. A diferença é que certamente ela não vai a nenhum País das Maravilhas. Era uma viagem a um outro mundo só de ida. Essa Alice - que não é loira como na história conhecida - estava jogando frisbee com os amigos em um passeio no parque e o brinquedo acabou indo parar numa parte distante dali... especificamente, uma floresta que muita gente não costumava frequentar.

Alice se voluntariou a pegar o objeto de volta rapidinho. Ela até encontrou, mas... uma outra coisa a distraiu até fazê-la esquecer daquele troço.

Ela ficou sua atenção em um homem parado perto das árvores grossas e das folhagens mais densas.

O tal homem vestia roupas sociais de um cidadão comum, mas sua cabeça estava coberta por uma aparente máscara ou cabeça de pelúcia de um coelho gigante, branco dos olhos vermelhos e orelhas bem grandes também.

Ele acenou chamando-a, oferecendo um ovo cor-de-rosa. O que era estranho, já que haviam se passado meses depois da Páscoa. Alice o seguiu, curiosa quanto ao presente.

O homem a guiou por caminhos da floresta que ela já não reconhecia, indicando que já estava longe de seus amigos e a saudade começou a apertar o coração. Pior do que isso era o odor que vinha da cabeça de coelho do cara. Era pútrido como carniça. De perto o pelo não tinha muita brancura, era até meio sujo e bastante podre, da altura onde os segui deu pra sentir.

Ele parou próximo a uma gruta com uma passagem com um buraco redondo - era localizada num ponto onde não tinham muitas árvores e tinha uma placa de madeira roída pelos cupins no início do território dizendo: "Área Restrita".

Daí aconteceu o inesperado. O cara ficou por trás de Alice, apontando com certa empolgação para uma parte como se dissesse "tem uma coisa ali que precisa ver, vai lá!". Ele entregou o ovo rosado à ela e a instruiu a seguir até aquela toca, o buraco que conduzia à gruta, fazendo umas linguagens de sinais.

Alice tirou o dedo que tapava o nariz quando se direcionou à toca, segurando o ovo com as duas mãos como se fosse um valioso artefato. Ela se afastava e a podridão abandonava seu olfato.

Essa é parte horripilante. Aproveitando que Alice já tinha entrado na toca, o cara foi até uma rocha e empurrou, empurrou, empurrou, empurrou... até fechar a passagem, sem deixar uma brechinha sequer nem para enfiar o dedo mindinho para fora. Pobre garota trouxa aquela.

Eu só ouvi um grito bem abafado lá de dentro enquanto o homem se desfazia da cabeça de coelho.

Pude notar uma coisa interessante: Quando ele tirou a cabeça que cobria a sua, vi na parte interior um vermelho que possuía uma tonalidade de carne fresca. O rosto do cara tinha manchas de sangue seco. Ele cavou um buraco com um pá velha largada, enterrou ali a cabeça e se mandou.

Alice provavelmente nunca mais foi vista por amigos e família.

E se aquela cabeça de animal fedia como carne apodrecida, significava que aquilo foi extraído de uma criatura viva.

Criaturas que recebiam ajudinha de pessoas mal-intencionadas dentro da toca e que saíam dela para caçar durante à noite o seu prato favorito:

Crianças.




*As imagens acima são propriedades de seus respectivos autores e foram usadas para ilustrar esta postagem sem fins lucrativos. 

*Imagens retiradas de: http://leiovejoopino.blogspot.com.br/2010/08/o-corvo.html
                                     https://www.walldevil.com/evil-bunny-wallpaper-885769/



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